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quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Contos de água e sal #1 Victor e a indiazinha do cerrado

Victor e a indiazinha do cerrado


Victor estava novamente passando um dia de férias sentado à beira de um riacho, no interior de uma pequena cidade de Minas Gerais. Esporadicamente, ele visitava a fazenda de seu tio, dono de uma criação intensiva de gado, para brincar com seu primo, Davi. Todavia, seu primo havia achado um outro amigo com quem brincar neste dia, e se encontrava na cidade vizinha. 
   Para não perder a viagem, Victor foi caminhar no cerrado, pelo entorno da fazenda. Subiu por uma trilha, que curiosamente foi sumindo conforme ele andava. Chegando ao topo, se deparou com a cabeceira de um rio, que desaguava num riacho poucos metros abaixo, e não pensou duas vezes para se despir e pular nele. Boiando, virado para o céu, pensando na morte da bezerra, nem chegou a notar as sangue-sugas que se acoplavam ao seu corpo. Quando percebeu, correu de súbito para a margem, arrancando uma a uma as sangue-sugas, que deixavam um rastro de sangue em seu corpo.
   Acauã, uma pequena índia de cara pintada, que vivia por perto, observava o estranho garoto na encolha, detrás das folhagens do cerrado, todo ensanguentado e pelado. Astutamente, recolheu algumas folhas que aceleravam a cicatrização e correu para entregá-las ao menino. Assustado, Victor deu um pulo, cobrindo-se por vergonha. Não tinha noção de que a indiazinha não ligava para um corpo desnudo, mas se preocupava em ajudar aquele que se punha em sua frente. 
   A indiazinha cobriu seus ferimentos com as folhas de cajueiro, enquanto o garoto sorria de volta, em gratidão. Palavras não lhes eram necessárias, eles já eram amigos a partir do momento em que se olharam. 
   - Vem, vamos brincar - disse Victor, esperando que sua nova amiga o entendesse. Ela, assentindo com a cabeça, correu junto com ele, pelo cerrado. As horas já não passavam como pequenas gotas de mar caindo numa ampulheta, no entanto, como jatos de ar expelidos pela baleia. Logo entardeceu. O pôr do sol era o sinal de que ambos deveriam se despedir. Acauã, com ternura, largou um doce beijo no rosto de Victor, que lhe respondeu com um abraço e um até logo. 
   As memórias da pequena índia ainda são frescas em sua memória. Victor, hoje em seus últimos resquícios da vida, não parava de lembrar de tal antiga história, caindo no mundo de sonhos, adormecido à espera de um novo pôr do sol.
   - Olá, velha amiga. Senti sua falta.

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